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A economia da Reputação e o papel da alta liderança

Uma boa reputação pode atrair clientes, investidores e talentos, além de proporcionar vantagens competitivas

Por Karla de Melo* para a edição 14 da Revista da Reputação, Junho de 2023.

Um dos ativos mais valiosos de uma organização (ainda) é negligenciado por líderes no dia a dia de sua tomada de decisão. A gestão e a governança da reputação são muitas vezes lembradas quando acontece uma crise e inevitavelmente esquecidas ao longo das tomadas de decisão que geram essa mesma crise. Uma reputação sólida pode aumentar a confiança dos consumidores, impulsionar as vendas e atrair investimentos.

Há alguns anos trabalhando como executiva e/ou consultora de reputação, afirmo que a maior dificuldade do mercado é justamente entender como esse processo é implementado na empresa. O nível de maturidade das organizações, da alta liderança e da área de comunicação corporativa que deve assumir essa liderança ainda é baixo. Muitas vezes essa implementação é confundida com ações de comunicação e na verdade, essa é uma reflexão de todas as áreas sobre seus próprios processos e sua relação com os diversos stakeholders na construção dessa percepção positiva ou negativa do negócio. É ao longo dessa jornada que se constrói a sustentabilidade e longevidade de uma empresa.

Trata-se de um ativo construído ao longo de anos, mas que pode ser perdido em questão de minutos. A gestão da reputação tornou-se um aspecto crucial para o sucesso de qualquer organização, pois influencia diretamente a percepção dos consumidores, parceiros de negócios e stakeholders em geral. Recentemente, a Balenciaga, uma marca renomada no mundo da moda, foi impactada pelos anúncios controversos em 2023 que levaram a uma mudança significativa na abordagem da empresa em relação à proteção de sua reputação.

Em um mundo interconectado, onde a informação flui rapidamente e as opiniões do público podem afetar significativamente o desempenho de uma empresa, a economia da reputação, um conceito que enfatiza o valor econômico da reputação de uma organização, destaca a necessidade de uma abordagem estratégica para a gestão da alta liderança, mas ainda é um desafio.

Compreendendo a economia da reputação
A economia da reputação envolve o reconhecimento de que a reputação de uma empresa possui um valor econômico tangível. Uma boa reputação pode atrair clientes, investidores e talentos, além de proporcionar vantagens competitivas. Por outro lado, uma má reputação pode resultar em perdas financeiras significativas, diminuição da confiança do público e danos à marca. O entendimento dessas questões precisa estar na agenda da alta liderança.

Os anúncios publicitários controversos lançados pela Balenciaga em 2023 tiveram um impacto significativo na imagem da marca. As reações negativas do público, a disseminação rápida de informações nas redes sociais e a cobertura negativa da mídia afetaram diretamente a reputação da empresa. A empresa perdeu valor de mercado e suas vendas caíram. Muitos influenciadores deixaram de trabalhar a marca ativamente, antes sinônimo de status e luxo. A controvérsia gerou preocupações em relação à ética, à sensibilidade cultural e aos valores da marca, resultando em uma queda na confiança do público. Uma crise pode ser gerada para além das ações de comunicação, entre elas, danos à reputação podem ser causados por má administração; por líderes não capazes pela gestão de pessoas; por gerar impacto negativo do negócio nas questões sociais e ambientais; em ambiente de trabalho tóxico ou até mesmo por processos operacionais sem considerar a dimensão reputacional quanto as decisões tomadas ou procedimentos que consideram apenas questões técnicas e financeiras. Nesse caso recente, a indexação do pagamento de François-Henri Pinault, presidente da Kering (empresa controladora da Balenciaga), aos esforços de proteção da reputação é uma prova de como o tema impacta o negócio. Essa medida demonstra o compromisso da empresa em corrigir os erros e investir na reconstrução da confiança do público.

Diante da crise de reputação, é essencial que as empresas adotem uma governança efetiva para lidar com a situação. Esse é o dever se casa mais básico, mas é uma ação de curto prazo e que apenas tenta diminuir o dano causado. Por outro lado, uma governança estruturada garante que a alta administração seja responsável pela tomada de decisões estratégicas e esteja comprometida em proteger a reputação da empresa. Isso implica em estabelecer políticas e diretrizes claras, comunicar-se de forma transparente com os stakeholders, agir de maneira ética e responsável, e implementar mecanismos eficazes de gerenciamento de crises.

A alta liderança é responsável por definir a cultura organizacional, estabelecer os valores e princípios éticos da empresa, além de tomar decisões estratégicas que podem afetar diretamente a reputação corporativa. A falta de comprometimento e compreensão da importância da reputação por parte da alta liderança pode resultar em uma abordagem reativa e inadequada para a gestão de riscos de reputação.

Para superar os desafios comuns ao implementar efetivamente a gestão de reputação na tomada de decisão, a alta liderança pode adotar as seguintes práticas:

Comprometimento de longo prazo: A alta liderança deve demonstrar um compromisso duradouro com a gestão de reputação e incorporá-la às estratégias e objetivos de negócio da empresa. A pressão para obter resultados imediatos pode levar a uma abordagem de curto prazo, em que a reputação é negligenciada em favor de metas imediatas. A alta liderança deve reconhecer que a gestão de reputação é um processo contínuo e de longo prazo.

Criação de métricas e indicadores: Desenvolver métricas e indicadores claros para medir e avaliar a reputação, permitindo uma tomada de decisão embasada em dados. Medir e avaliar a reputação é essencial para tomar decisões informadas.

Educação e formação: Investir em programas de treinamento e educação para a alta liderança, a fim de desenvolver sua compreensão da gestão de reputação e suas habilidades nessa área.

Comunicação transparente: Estabelecer uma comunicação transparente com os stakeholders, promovendo a confiança e a transparência em todas as interações. Fundamental estruturar as áreas de reputação e comunicação corporativa com uma atuação mais estratégica, liderando esse processo.

Gestão da mudança: Realizar uma implementação com governança e gestão dos processos de reputação. Eles exigem mudanças culturais e organizacionais significativas. A alta liderança deve estar disposta a enfrentar a resistência à mudança e promover uma cultura que valorize a reputação como um ativo estratégico.

Implementar efetivamente a gestão de reputação na tomada de decisão da alta liderança é essencial para garantir uma abordagem estratégica e proativa para a proteção e valorização da reputação corporativa. Embora existam desafios a serem superados, as melhores práticas, como o comprometimento de longo prazo, a definição de métricas claras e a busca por conhecimento especializado, podem ajudar a alta liderança a incorporar efetivamente a gestão da reputação em sua tomada de decisão. Ao fazer isso, as empresas estarão mais bem preparadas para enfrentar os desafios do ambiente de negócios atual e preservar sua reputação a longo prazo.

* Karla de Melo é Relações públicas. Executiva de grandes empresas nos setores de tecnologia, telefonia, siderurgia e na indústria da mineração, trabalhou na Vale por 20 anos. Atualmente é Head de reputação e comunicação corporativa da Firjan – Federação das Indústrias do Rio de Janeiro.