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A reputação está nas mãos dos colaboradores

Quando penso em reputação lembro do meu pai. E não é papo de filha enxergando o pai como herói. A memória não é necessariamente doce, mas educativa. Ele sempre foi trabalhador, íntegro e pontual. E isso para uma menina como eu, nascida e criada numa favela do Rio de Janeiro, preta e órfã de mãe aos 14 anos, diz muito. Afinal, é preciso ter valores para suportar e superar essa realidade sem virar estatística. Ele me diz desde muito nova “Você só tem o seu nome, cuide dele”.

Ou seja, entendi desde sempre que se combinou deve cumprir, que é proibido ficar devendo e que meu comportamento me apresenta e representa toda minha família. Pronto, chegamos ao ponto central. Caráter. Às vezes a gente fala de reputação como algo distante, que requer erudição. Não necessariamente.

Meu pai é um homem simples, motorista, e um especialista no assunto. Sem reputação um restaurante fecha, as pessoas mudam de salão de beleza e marcas morrem. E o mesmo vale para indivíduos. Um CPF de conduta duvidosa perde credibilidade, tem relações frágeis e uma vida vazia.

Preocupadas com ações e lucro, empresas focam mais em parecer do que em ser. Mas gente, estamos no século XXI, altamente conectados. Com as redes sociais pipocando ainda faz sentido uma empresa, independente do tamanho, se maquiar? Essa ideia já me parecia fadada ao insucesso há tempos e em 2020, que certamente será estudado pelas próximas gerações, ela se mostra ainda mais frágil. Quantas marcas não eram amadas e foram bloqueadas por ignorarem declaradamente um fenômeno mundial?

E silenciar já não é uma saída também. Quem não se posicionou ou se movimentou para proteger a população mais impactada pela pandemia perdeu espaço. Mesmo que em seus sites falassem sobre projetos sociais incríveis, estratégia de sustentabilidade, diversidade e inclusão. Chegamos à época em que não basta estar no papel (que aceita tudo) precisa estar refletido no comportamento, em práticas, precisa ser de verdade.

Falando em reputação, outra confusão ainda muito praticada é vender uma empresa para fora e dentro ela se revelar outra. Vamos combinar que essa é uma solução cara demais. Ela impacta na atração e retenção de talentos, gera dores às famílias dos colaboradores que os veem sofrer, e não engaja as comunidades vizinhas, investidores, clientes.

Uma vez participei de um processo seletivo e a consultoria de RH disse que a empresa em questão “gostava de gente”. Sou jornalista com MBA em Comunicação Integrada e cursando MBA em Gestão Estratégica de Pessoas. Já imaginou como meus olhos brilharam ao receber essa informação? Tudo estava bem até que na etapa seguinte soube o nome da empresa e pensei: “Eles gostam de gente. De moer gente.” Escolhi ali, com base em tudo que já ouvi sobre a marca, não dar sequência ao processo. Felizmente pude tomar tal decisão, mas há quem não consiga e se submeta.

Enfim, se eu pudesse aconselhar empresas eu diria para se agarrarem em metodologias, consultorias, pesquisas e tudo mais para construírem e/ou manterem a reputação. Porém, mais importante que isso, apostem nas pessoas de bem, como diria meu pai. Gente que trabalha duro, acredita e pratica os valores da empresa dentro e fora dela.

Que tal começar por um diagnóstico, um questionário com seus diferentes públicos? Saber onde está, reconhecer os gaps existentes e se comprometer a saná-los é crucial. Adicione a isso boas práticas e, claro, paciência. A gente não constrói ou transforma a reputação da noite para o dia. Sigamos.

* Ana Paula Castro Dourado é ,especialista de comunicação interna da Bracell.