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Cultura e propósito para engajar os empregados e enfrentar a instabilidade

Aprendemos e orientamos nosso pensamento para lidar com crise como algo estanque: uma situação inesperada – ligada a um risco ou não – que se deflagrou e que precisa de um desfecho definido. Bem, esses são tempos passados. A despeito de manobras ou acordos políticos e medidas econômicas mais ou menos polêmicas, as empresas brasileiras já sabem que vão enfrentar um período continuado de crise. Mais que apenas recessão econômica, queda nas vendas de produtos e serviços, a crise permeia aspectos que vão além da falta de recursos.

Além de impactados pelo medo do desemprego, os trabalhadores brasileiros, não podemos esquecer, são cidadãos comuns, que estão se reinventando num mundo cada vez mais marcado pelo acirramento nas relações sociais, pelo choque de opiniões inter geracional, pela intolerância e pela disputa pela manutenção de direitos e também de privilégios que hoje não encontram mais lugar.

E esse trabalhador que vê seu próprio bem-estar ameaçado – seja pela economia, seja por mudanças comportamentais que vieram para ficar – é, muitas vezes, o primeiro contato do consumidor com a sua marca. As empresas estão se dando conta, ou deveriam, de que a crise econômica não vem sozinha. Está acompanhada com iminente risco de crise de imagem, de identidade e de relacionamento. Viver em permanente estado de enfrentamento de instabilidade, torna-se, portanto, mais um dos desafios que a Comunicação deve contribuir para enfrentar, ao se posicionar como uma parceira interna estratégica para os negócios.

Não dá para entender, mas parece que estamos sempre mais preparados para as crises externas que para as internas. O temor da perda de vendas ou de valor de mercado da companhia não é o único a assustar. Sempre esperamos que os empregados estejam firmes e sejam os defensores da marca quando uma crise externa aparece – um acidente, um risco ambiental, desabastecimento, um abalo financeiro e de credibilidade. Mas e quando a situação crítica está dentro? Fragilizadas pela péssima situação econômica do país, as empresas brasileiras acabam mais expostas a riscos operacionais, de segurança, de integridade, qualidade e compliance.

O fato é que agir é sempre melhor que reagir. Algumas frentes são essenciais para manter eficiente a comunicação interna em tempos de crise:

  • Fomentar a adesão à cultura interna para tentar minimizar impactos.
  • Reforçar o entendimento pleno do propósito da empresa, para não deixar cair a peteca do engajamento.
  • Adequar melhor a comunicação interna aos millenials – em poucos anos eles serão a maioria na força de trabalho.
  • Usar recursos e linguagens de redes sociais para manter o diálogo aberto com os empregados em um mundo hiperconectado.

Começando pela cultura, a frase de Peter Drucke, Culture eats strategy for breakfast, nunca fez tanto sentido. Estivemos muito preocupados, durante muito tempo, em construir uma imagem positiva, um discurso positivo, sobre nosso ambiente. Hoje isso não é suficiente. A cultura precisa atender àquilo que as pessoas – empregados e consumidores – esperam da marca.

E a forma como a cultura interna está construída pode ser uma aliada ou uma pedra no sapato nesses tempos de crise. Muitos fatores que estão na gênese ou que agravam as crises reputacionais estão inscritos na cultura – medidas ou comportamentos excludentes ou não inclusivos em nome de valores como tradição. Bullying ou discriminação em nome de fatores como “exclusividade”, “luxo”. Então, será que não está na hora de rever essa cultura para evitar o risco de crise?

No dia a dia, como fazer a cultura ajudar, e não engessar ou mesmo atrapalhar?

  • Capitalize inicialmente os pontos fortes da cultura;
  • Contrabalanceie a resistência cultural;
  • Chega de Isolamento. Promova a integração e colaboração do sistema como um todo.
  • Peça ajuda e insights dos pioneiros no apoio à mudança, quem vem sempre primeiro com o feedback.
  • Comece mudando comportamentos críticos em vez de modos de ver o mundo.
  • Use métodos virais.
  • Mobilize o racional e o emocional.

O fato é: não é preciso acontecer nada externo para que uma grande crise surja e ultrapasse os muros da empresa. Prevenir crises provocadas por questões que estão dentro das empresas, passa, inicialmente, pela prática dos valores. E estes precisam ser o que, de fato, a empresa valoriza. Em vez de evitar, promover a gestão de temas sensíveis (issues) que são parte da cultura corporativa e ajudar, via comunicação, a construir modos de enxergar que busquem sempre as oportunidades positivas em incidentes negativos. Ao estarmos focados em encontrar formas de construir e estreitar laços de confiança com nossos stakeholders, nossos empregados, desde que orientados e incentivados, vão saber como agir rapidamente em momentos de acontecimentos negativos.

Meaning is the new Money

As empresas que mais crescem e as mais admiradas são aquelas que tem um propósito e o deixam claro. Por isso, é tão importante deixar claro para ambos os públicos qual é o propósito da marca. Não é o que a gente faz – o melhor produto – nem como a gente faz – com a melhor tecnologia, oferecendo bem-estar aos nossos empregados – mas o porquê a gente faz.

O novo consumidor (lembra-se daquele antigo pago sobre o empoderamento da classe C e sobre o que faz uma pessoa comprar hoje em dia? Então…) quer comprar de uma empresa com propósito. Os melhores talentos ficam nas empresas quando se identificam com seus valores. Simples assim. A sustentabilidade dos negócios se direciona para o propósito, não para o lucro. Lucro é um dos produtos, não o resultado principal.

Então, quando questionamento do propósito e a crise se esbarram, está na hora de a Comunicação interna lembrar que faz gestão de relacionamento e contribuir para que as pessoas entendam esse propósito. Isso é contribuir diretamente para a sobrevivência o negócio. Lá na frente, gente que só trabalha pelo salário mal vai te entregar apenas o que é obrigado a fazer. A produção. Só que em cenários de crise, quando é enorme a necessidade de se diferenciar no mercado, vão se salvar aqueles capazes de inovar. Um empregado que não entende os propósitos da marca não vai levar a empresa à inovação. Não vai criar nada novo, ele sabe que não tem dinheiro sobrando para ele ser reconhecido. A recompensa precisa ser algo além de dinheiro. As coisas precisam ter significado.

E precisam de significado mesmo, pois em menos de 15 anos os millenials serão a maior geração de consumidores e de trabalhadores que o mundo já teve. Nativos digitais, eles – não importando a classe social – são capazes de influenciar outras gerações com seus comportamentos e transformar o mercado ao imporem suas próprias lógicas de consumo, pois tem a tecnologia em suas mãos. Eles nasceram e estudaram numa época de prosperidade econômica, num mundo já globalizado, mas amadureceram e agora tentam se firmar no mercado em profunda crise econômica. É uma geração pobre. Por isso, busca enxergar valor em outras coisas.

As redes sociais nos ensinam muito como esse trabalhador da geração Y se relaciona na vida. Para falar com ele, desprenda-se das velhas fórmulas. Crie uma experiência. Eles querem participar, querem conteúdo para compartilhar. Eles gostam de legitimar e ser legitimados, querem viver uma história junto com a empresa/marca, e não ouvir a história. Se sua empresa tem uma causa, será respeitada por millenials, é uma geração que sabe que, na vida, devemos fazer as coisas que importam. Aproveite isso para fazer coisas que nunca foram feitas antes. E permita um pouco de diversão no trabalho. Afinal, gerenciar cenário sempre é melhor do que gerenciar crise.

* Monique Cardoso é Gerente da área de Comunicação Institucional da Approach.