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Entrevista: Andrea Mota, Diretora de Sustentabilidade da Coca-Cola Brasil

“Estamos nessa juntos”. É assim que Andrea Mota, diretora de sustentabilidade da Coca-Cola Brasil, tem concluído, nos últimos tempos, a maioria de seus posts no Linkedin, onde é bastante ativa. Com mais de 18 anos de empresa, ela migrou da área de Marketing para a de Relações Corporativas há cinco anos, sendo que há três assumiu a posição atual.

Conversamos com Andrea sobre as atividades da empresa pró-sustentabilidade antes e durante a pandemia de Covid-19, os desafios que têm sido superados e as janelas de oportunidade que estão se descortinando no horizonte. Ela se sente privilegiada de trabalhar em uma empresa que destinou R$ 45 milhões em recursos para o combate ao novo coronavírus e se preocupa com todos os seus stakeholders, seja sua rede de parceiros, suas comunidades, ou seus empregados – ao ponto de viabilizar que eles recebam suas cadeiras do escritório para trabalhar em casa, neste período prolongado de home office.

Marcia Cavallieri: Poderia dar um panorama geral sobre os principais drivers e programas de sustentabilidade da companhia no Brasil? Como se alinham ou se diferenciam dos programas globais da Coca-Cola?

Andrea Mota: Temos liberdade para ajustar e tropicalizar os programas globais de sustentabilidade conforme a realidade local. Desde 2015 a empresa faz um estudo de externalidades para identificar as questões prioritárias para a Coca-Cola Brasil e então temos três grandes áreas principais: água, embalagens e portfólio. Buscamos mais eficiência no uso da água dentro das fábricas e mais reposição hídrica fora delas. Para as embalagens, o plano “Mundo sem resíduos”, estabeleceu a meta global da The Coca-Cola Company de, até 2030, coletar e reciclar o equivalente a 100% das embalagens colocadas no mercado. E na oferta de produtos em si, pensamos no consumo de açúcar e na saúde dos consumidores. Em seguida a estes três grandes drivers temos outros três considerados mais relevantes para a sustentabilidade da companhia, que são agricultura, carbono e diversidade.

Ao longo das quase duas décadas em que você trabalha na Coca-Cola, houve uma grande diversificação do portfólio de produtos, muito além dos refrigerantes. Paralelo a esta mudança, como você percebe a evolução da empresa em termos de reputação?

O movimento de diversificação de produtos é antigo. Para nós, quem dita a velocidade das mudanças são os consumidores, as pessoas. Se elas querem mais opções além de refrigerantes, estamos dispostos a oferecer. Hoje temos mais de 200 produtos. A Coca-Cola completou 134 anos em maio (sendo 77 de atuação no Brasil) e a ampliação de portfólio vem acontecendo numa velocidade compatível com a capacidade da empresa de traduzir o sentimento das pessoas. E acredito que isto se reflete na reputação da companhia.Nossos principais indicadores estão reunidos em um estudo global interno da Coca-Cola, que não comentamos externamente.

Você considera que a pandemia pode ser considerada um “acelerador de mudanças” que já estavam previstas ou em curso na empresa?

De modo geral, acredito que as pessoas estarão mais conscientes, mais preocupadas, mais informadas e entendendo melhor o impacto do consumo. Com isso, podem até cobrar mais atitude das empresas. Na Coca-Cola já vínhamos trabalhando a sustentabilidade de forma transversal, dentro do negócio, e penso que teremos um cenário mais receptivo para as mudanças que venham a se mostrar necessárias. Posso repetir as palavras de Bea Perez, nossa VP global de Comunicação, RP e Sustentabilidade, “o propósito da The Coca-Cola Company de refrescar o mundo e fazer a diferença nunca foi tão importante ou relevante”.

Olhando para o mercado, nos últimos anos já vinha crescendo a importância de as empresas terem claro seus propósitos sociais, mas a pandemia do novo coronavírus elevou isso a um outro nível e deixou ainda mais evidente a relevância para as marcas de desempenhar um papel transformador na sociedade. Acredito que é uma oportunidade para o trabalho de sustentabilidade ajudar a construir o novo mundo que queremos.

Andrea Mota, Diretora de Sustentabilidade da Coca-Cola Brasil.

Você pode falar um pouco sobre as iniciativas da Coca-Cola Brasil relacionadas ao combate ao coronavírus?

Com nossa grande capilaridade, o Sistema Coca-Cola tem conseguido realizar ações em diversas cidades, de norte a sul do país, para o enfrentamento da Covid-19 e de suas consequências. Como temos uma relação de confiança com as comunidades nas quais estamos presentes, buscamos contribuir mantendo nossas operações e direcionando recursos para ajudar os segmentos mais vulneráveis da população com os quais já temos um relacionamento sólido. Já direcionamos mais de R$ 45 milhões na luta contra o coronavírus. Nossas iniciativas se dão especialmente por meio de parcerias e se fundamentam em três pilares: Comunidades, Saúde e Segurança, e Ajudas regionais.

No primeiro pilar, criamos um fundo para beneficiar segmentos de baixa renda em 71 comunidades de 14 estados e Distrito Federal, abrangidos pelo nosso programa Coletivo Jovem. Os recursos vão para ONGs e instituições parceiras que os repassam da maneira mais útil para o combate à Covid-19 em cada localidade, seja em cestas básicas ou artigos de higiene e limpeza. Já para os catadores, parte fundamental da nossa cadeia de reciclagem, buscamos a melhor solução para atendê-los neste momento, e nosso foco é contribuir na garantia da renda mínima de R$ 600 para cerca de 11 mil cooperados e autônomos, além de R$ 2 milhões em cartão alimentação.

No pilar de Saúde e Segurança, nos concentramos em doações de água mineral (2 milhões de litros até agora), de garrafas PET para envase de álcool, de máscaras de proteção e EPIs, além de realizar transporte de álcool a 70%. Outra iniciativa a destacar foi a parceria firmada com a Coca-Cola FEMSA, nossa maior engarrafadora, a Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, o Instituto Butantan, a Bradesco Seguros e o Grupo Fleury, destinando R$ 4 milhões para ampliar a capacidade de processamento de testes para diagnóstico da Covid-19 destinados com prioridade a profissionais de saúde. No pilar das Ajudas regionais, procuramos nos articular com as comunidades e com as prefeituras para doação de alimentos (30 toneladas até o momento) e de água mineral para os hospitais de campanha ou de referência em Covid-19. Além das ações desenvolvidas por nossos fabricantes.

Qual o nível de autonomia dos fabricantes para realizar suas iniciativas regionais?

Como em um sistema de franquia, nossos fabricantes têm independência para desenvolver suas iniciativas, mas geralmente eles nos procuram para contar e acabamos confirmando o alinhamento, a sintonia com nossas práticas.

Você já consegue avaliar os reflexos das iniciativas relacionadas à Covid-19 para a reputação da companhia?

Alguns rankings de mercado já se arriscam a avaliar o impacto das iniciativas das empresas para suas marcas. Pesquisas como a da HSR Specialist Researchers, que criou um indicador e ranqueou as marcas mais transformadoras na pandemia na percepção dos consumidores. A Coca-Cola ficou entre as top 10 da lista, que leva em consideração atributos como ações voltadas à sociedade, investimentos na segurança de seus consumidores e funcionários, entre outros.

Além disso, percebi uma mudança durante essa crise da Covid-19 no que diz respeito à abertura da imprensa para mostrar as iniciativas das empresas privadas no combate ao coronavírus. O trabalho desenvolvido pelo Sistema Coca-Cola Brasil em todo o país já ganhou destaque em vários veículos de abrangência nacional, e fico muito grata por ver as mídias locais dando espaço para essas iniciativas regionais, que são fundamentais para conseguirmos resultados efetivos. Mas o que nós fazemos não visa ao reconhecimento, e sim atender ao senso de responsabilidade com as nossas comunidades.

Até o momento, quais você considera seus principais aprendizados com esta pandemia?

Me surpreendi com minha capacidade de adaptação e reinvenção, e arrisco dizer que às vezes me sinto até mais produtiva e motivada. Em termos de mercado, vejo a colaboração que vem se intensificando entre as empresas, a capacidade de se articularem e cooperarem até com concorrentes e players de outros setores. Creio que essa união entre empresas, em prol da sociedade, vai ser cada vez mais comum de agora em diante, se tornando um dos aprendizados desta crise tão dura que estamos vivendo. Além disso, a colaboração entre as pessoas, a solidariedade, a empatia e o olhar mais generoso com os outros, espero que se prolonguem após este momento de crise aguda. Que tudo isso fique como legado positivo e que tenhamos aprendido alguma coisa, após tantos desafios e sofrimento. Estamos nessa juntos.

* Marcia Cavallieri é consultora associada da Makemake – A casa da Reputação e subeditora da Revista da Reputação.