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Michel Temer: Quanto mais brigar contra a alcunha de golpista pior

Desconfortável com a narrativa de golpe, presidente Michel Temer agrava a situação ao dizer que não aceitará ser chamado de golpista e ao dar depoimentos que minimizam os protestos. O ideal seria não alimentar a polêmica.

Em momentos de crise, qualquer palavra deve ser muito bem pensada antes de ser proferida para que a situação não se agrave. Nitidamente desconfortável por ser chamado de golpista pela parcela da população contra o Impeachment de Dilma, o presidente Michel Temer tem dado algumas declarações que não contribuem para que o seu nome descole desta alcunha. O maior exemplo ocorreu em seu discurso de posse, quando afirmou que não aceitaria ser chamado de golpista. Para seus oponentes, tal declaração soou como autoritária e antidemocrática, incitando a população a reforçar o coro nas redes sociais e nas ruas. Certamente, não era momento para “dar aquele recado”. O mais prudente seria reconhecer que estamos em um momento de grande divisão no país, mas que ele iria trabalhar para todos, pelo bem de todos, como é de se esperar de um presidente da república.

Apesar da repercussão negativa do recado dado na posse, dias depois, o presidente insistiu no erro ao tentar minimizar os protestos contra ele dizendo que vinham de uma parcela inexpressiva da população, 40, 100 pessoas no máximo. Mais uma vez, a declaração inflou os opositores e a resposta veio nas ruas e nas redes sociais, com as maiores manifestações contra o Impeachment acontecendo logo em seguida.

Na Assembleia Geral da Onu, último dia 20 setembro, mais uma vez, Temer usou o espaço para comentar a legalidade do processo de impeachment que o levou ao poder. Falou para uma plateia de líderes internacionais e, sua equipe, ao comentar os protestos de alguns de nossos vizinhos, tentou minimizar o fato relativizando, para usar uma palavra educada, a importância dos países que protestaram. A resposta veio em peso quando a ONU publicou em seu instagram uma animação feita a partir de uma foto de Temer, tendo como legenda parte de seu discurso. Se publicações cotidianas da entidade recebem cerca de duzentos a trezentos comentários nesta rede social, a imagem do nosso presidente bateu todos os recordes, acumulando mais de 38 mil comentários, a grande maioria pedindo o “#ForaTemer” em português ou na versão “GetOutTemer”.

Em situações de crise, o recomendado é que as respostas dos envolvidos não incitem raiva e não menosprezem stakeholders. É de bom tom que as mensagens não contenham ironia ou arrogância. E é também de bom tom que elas não alcancem públicos não previamente impactados pelo motivo gerador da crise.

Bruno Machado (foto ao lado), sócio da agência 3 Com, doutorando em Educação e mestre em Gestão Pública, concorda que não é interessante para Temer promover conversas que girem em torno da narrativa de golpe, principalmente no calor do improviso. Contudo, ele aponta que as últimas notícias já dão conta de que Temer esteja trabalhando em um planejamento estratégico de comunicação que afine e concentre o discurso oficial, evitando ruídos e desgastes.

“Temer precisa se afastar deste discurso de que não foi golpe promovendo uma agenda positiva e sabendo que tudo o que fizer será interpretado de forma negativa pela oposição.” Bruno Machado

Porta-voz pode ser boa opção

Bruno enfatiza também que o calor dos acontecimentos não favorece boas decisões nem bons pronunciamentos. Deste modo, é importante que Temer evite ao máximo pronunciamentos de improviso e redobre a atenção sobre os pontos que podem causar ou agravar crises, tendo respostas objetivas e técnicas.

E como é de se esperar que tudo o que ele venha a fazer seja interpretado de forma negativa pela oposição, o especialista acredita que a adoção de um porta-voz pode amenizar as ofensivas contra ele.

“O Temer fala muito bem e deve tirar proveito disso. A função deste porta-voz seria a de alinhar a comunicação entre os integrantes do primeiro escalão, que já demonstrou um nível de descoordenação preocupante, além de funcionar como uma carta na manga, alguém preparado para falar sobre qualquer assunto, se necessário for”, resume.

Outro ponto importante a frisar é que as pessoas estão cansadas de falas vazias, tidas como “em cima do muro”, assim como estão cansadas dos políticos que mudam de opinião a favor dos acontecimentos em busca de favorecimento pessoal – dois aspectos associados ao PMDB.

Uma dica que serve tanto para Temer como para outros políticos em situação de crise de imagem é a aposta no storytelling. “Eles precisam construir narrativas mais sólidas, que justifiquem seus movimentos e decisões de tal forma que os eleitores tenham empatia e estejam convencidos de que se lá estivessem, teriam feito o mesmo”, afirma Bruno.

Foto de Michel Temer: Beto Barata/PR, Agência Brasil