Polarização, diversidade, lowsumerism e os impactos na reputação
No final de janeiro, aconteceu a reunião anual do World Economic Forum (WEF), em Davos, com o tema Globalização 4.0, que reuniu líderes de todo o mundo para discutir sobre como cooperar nos desafios da nova era econômica. A chamada Quarta Revolução Industrial – onde a tecnologia transforma realidades globalmente, provocando uma disruptura nos negócios e uma expressiva mudança na forma de viver – traz nova relevância a dimensões como Inovação e Produtividade, Segurança e Conflito, Desigualdade, Ética e Identidade, sendo esta última a que mais importa no campo da reputação. Um painel debateu o papel dos CEOs na construção de marcas e reputação nesta nova era e contou com a CEO do Reputation Institute (R.I.), Kylie Wright-Ford.
Enquanto isso, no Brasil, a Profa. Dra. Ana Luísa Almeida, presidente e fundadora local do R.I., falava sobre tendências da sociedade contemporânea que implicam em desafios para a gestão da reputação das empresas. Ela apresentou o impacto de oito macrotendências que implicam em riscos e oportunidades reputacionais – conteúdo compartilhado de um evento do R.I. em Boston.
Macrotendências = oportunidades e riscos reputacionais
1. A Polarização da Sociedade em torno de temas que provocam a divisão dos cidadãos em grupos com opiniões extremas e opostas gera o acirramento das relações e consequente insegurança e fechamento das pessoas. Surgem “bolhas sociais” quanto se trata de assuntos que podem variar da eleição presidencial de Trump nos EUA ou de Bolsonaro no Brasil, até a polêmica britânica do Brexit ou a questão migratória mundial. Em meio às mídias sociais, cada indivíduo se sente chamado a ter uma opinião sobre questões sensíveis que causam polarização na opinião pública e colocam as organizações em tensão. No meio corporativo, toda tomada de decisão do quadro executivo pode gerar uma polarização interna ou externa à empresa. A existência – ou a falta – de coerência ente o discurso e a prática de uma organização dão mostras de sua autenticidade e, naturalmente, tem reflexo sobre sua reputação. Daí a importância de a liderança realmente liderar, orientar suas equipes sobre como a empresa se posiciona sobre assuntos internos ou externos que vão de diversidade e gênero até ética, assédio e sustentabilidade, por exemplo. De que forma a polarização da sociedade tem impactado a Gestão da Reputação nas organizações? Recomenda-se o levantamento de temas que podem repercutir mais em empresas do seu setor para então definir posicionamentos e comunicar com agilidade e transparência.
2. A Importância das Novas Gerações é inegável e isto impacta de forma especifica na gestão de reputação. Comprometidos com suas crenças, os jovens movimentam e sacodem o mercado. Como fazer de Millenials novos clientes? Como atrai-los enquanto talentos e lidar com estes profissionais internamente? A relação é complexa, levando-se em conta que pode haver três ou até quatro gerações convivendo dentro de uma empresa – os baby boomers, os da geração X (nascidos nos anos 60 e 70), geração Y (ou Millenials, os acelerados nativos digitais nascidos nos anos 80) e a Z (os individualistas, nascidos em meados dos anos 90), que ainda está chegando ao mercado de trabalho. Como integrar nas empresas as novas gerações, com seus novos valores? E, se a rotatividade aumenta, a organização precisa atualizar seu discurso para contratar e reter talentos, ou pelo menos ter disponibilidade de refletir sobre isso.
3. O Lowsumerism – consumo consciente põe em pauta a questão da sustentabilidade, lembrando que a Terra é nossa casa, não um gigante shopping center. Com a industrialização, as pessoas foram incentivadas a consumir mais do que o necessário. Mas a explosão do consumo “evoluiu” a um nível de consumismo individualista, que chega a gerar nas pessoas um estado permanente de ansiedade, acentuado pela tecnologia dinâmica que faz querer sempre algo novo. A partir de 2010, a economia do compartilhamento passou a propagar o acesso sem a necessidade da posse, e o questionamento do consumo vem demandando a redução de excessos. Três ações básicas ajudam a atenuar o comportamento consumista: pensar antes de comprar, buscar alternativas que impactem menos o meio ambiente, e viver apenas com o que é necessário. Vale verificar em que frentes sua empresa atua para fomentar o consumo consciente entre seus stakeholders.
4. Novos paradigmas da informação: transparência e visibilidade se estabelecem. A vulnerabilidade de internautas e de organizações é crescente. Todos têm maior exposição a ataques cibernéticos e sua privacidade de dados sofre riscos. Os ataques vêm crescendo e, além disso, fake news e comentários em redes sociais podem atingir qualquer pessoa ou empresa. E aí não interessa muito se foi cometido um erro ou não, importa é o que está circulando de informação na web. Transparência e agilidade são fundamentais para atenuar os danos corporativos e dar visibilidade a mensagens positivas e verdadeiras. Como sua empresa mantém a coerência na comunicação em situações de vulnerabilidade, visando proteger sua reputação e seu patrimônio de dados?
5. O Empoderamento de novos atores sociais envolve youtubers, blogueiros e qualquer repórter cidadão, que passam a influenciar com sua palavra, mesmo se pouco fundamentada. Assiste-se ao “desabrochar” de novos grupos, nichos ou minorias antes escondidas, que “soltam a voz” nas redes sem se preocupar com os estragos que podem gerar. O grave é que os stakeholders tradicionais não se prepararam para esse novo cenário – reguladores e autoridades “no poder” deixaram um gap, pois ainda não criaram leis nem restrições.
A regulamentação não conseguiu acompanhar o dinamismo da tecnologia e a criatividade desses novos atores sociais, que emergem e alteram a dinâmica social. Surgem novos paradigmas e a organização precisa cuidar do trinômio DEI – diversidade, equidade e inclusão. E por equidade entenda-se justiça com o público interno, com a comunidade de fornecedores e na forma de fazer negócios (com clientes e parceiros). Fica difícil monitorar tudo e todos, mas cabe mapear quais, entre os novos atores sociais, têm sido os mais desafiadores para sua empresa.
6. Quais as Representações Simbólicas das empresas hoje? Em meio a lava jato, carne fraca, escândalos, delações e muita lama, verificou-se a queda de 5,4% na média de reputação das empresas do Brasil no ranking global do Reputation Institute de 2018 – comparada à redução de 1,4% das empresas no mundo.
Para qualquer ação da organização , uma reação contrária ou a favor acontece – podendo haver a polarização de apoiadores e detratores. Mas as organizações aprendem na dor, ao invés de se preocuparem mais e se prepararem melhor para uma eventual gestão de crise e reputação, acabam tropeçando em análises e gestão de risco inadequadas e sistema de gestão de crise fraco. Enfim, que representações simbólicas sua empresa precisa desconstruir?
7. A Valorização dos intangíveis – como marca e propósito – pelos públicos é nítida, e surge uma nova necessidade: o “Legado Corporativo”. Para ganhos da empresa e da sociedade, as corporações “com consciência, por meio de seus líderes, passam a se posicionar no debate sobre temas sociais sensíveis e controversos como Diversidade e inclusão; Meio ambiente; Gênero e orientação sexual. Fica a pergunta: o legado da sua organização é claro para a sociedade?
8. No Diálogo multi-stakeholder da atualidade há várias vozes paralelas e as empresas não têm mais o protagonismo. Mas como alinhar (não controlar) as relações com os stakeholders?
Como as corporações mudam muito mais lentamente que a sociedade, é preciso ajudá-las a serem proativas, se abrirem para o diálogo e para a mudança. Incentivar que a organização ajude a comunidade em pontos que lhe são sensíveis , mesmo não sendo responsável por tais problemas. Deve-se aproveitar o aprendizado de compartilhar experiências com os , e conviver com oportunidades e riscos das mídias sociais. Em ambientes mais complexos, com quais públicos deve-se relacionar, avaliar as relações, monitorar e priorizar na gestão da reputação?Enfim, como a sua empresa tem lidado com a criticidade externa e interna?
O grande desafio talvez seja desenvolver uma cultura de reputação e criar uma Plataforma de Reputação que reúna todas as áreas da empresa envolvidas no comitê de crise. Ter um processo dinâmico de traçar e rever o mapa de questões chave a cada trimestre e, conforme o momento, priorizar os objetivos de gerar valor, proteger valor ou recuperar valor.
* Marcia Cavallieri é consultora associada à Makemake e subeditora da Revista da Reputação